Seja um voluntário, onde o seu coração indicar
Artigo de Fernando Brancaccio, especialista em Neurociência e Palhaço.
Há quase dez anos decidi fazer uma pausa na carreira. Meu corpo pedia e minha mente implorava. Era hora de cuidar da saúde e de planejar cautelosamente os próximos passos, de tentar imaginar o futuro e decidir qual caminho seguir, numa cena digna daqueles filmes onde você se depara com uma encruzilhada com várias setas antagônicas indicando: Sucesso, Risco, Aprendizado, Investimento, Aposentadoria, Empreendedorismo, Desemprego, Felicidade… Sem ao certo saber qual direção adotar, arrisquei que era o momento de entender melhor e trilhar meu Propósito dali em diante e quase “sem querer querendo”, como dizia Roberto Gómez Bolaños, na voz de sua inesquecível personagem Chavez, acertei em cheio o caminho da Felicidade!
Em um breve, mas intenso período sabático, mergulhei em investidas até então desconhecidas e necessárias, como seções de psicanálise, acompanhamento reumatológico (consequências do burnout, artrite psoriática e fibromialgia – todas doenças psicossomáticas adquiridas e que hoje entendo como preço alto a pagar por minha completa falta de gestão emocional enquanto executivo), além de dois cursos que mudaram o rumo da minha vida: uma Especialização em Neurociência e um curso extensivo de Palhaço. E, sim, em virtude dessas duas capacitações transitei por universos até então inexplorados como a mente, a arte e a humanização.
Tão logo conclui o curso de linguagem clown, recebi um convite inesperado e assustador de fazer parte do Departamento de Voluntários de um dos maiores Hospitais da América Latina, me juntando a uma trupe de palhaços visitadores. Mesmo tendo receio desse ambiente por mim desconhecido, aceitei o desafio e em pouco tempo já havia me apaixonado pela missão de visitar pacientes e tentar, mesmo que por alguns instantes, tirar o foco da dor, da preocupação e do medo! A cada ala da pediatria, da oncologia, UTI, transplantes ou mesmo consultórios observados da ponta de um nariz vermelho (a menor máscara do mundo, como nós palhaços gostamos de dizer) nos deparamos com histórias de superação, de aflição, de alegria, de luto, de estresse, irritação, coragem… Percebi que o ambiente hospitalar de altíssima complexidade, que até então me amedrontava, passou a me encantar, intrigar e ensinar com todas as suas nuances emocionais: do estresse das equipes de saúde (sobretudo em tempos de pandemia), ao alívio do paciente que recebe alta; da tristeza de quem recebe um diagnóstico grave ao êxtase de avós ao conhecerem um netinho(a) que acabara de chegar ao mundo, da impaciência de acompanhantes que quase nada podem fazer para aliviar a dor de um ente querido à completa atenção plena das equipes de psicologia, fisioterapia, cirurgias e enfermagens em suas inúmeras atribuições que exigem concentração e foco no cuidado dedicado ao outro.
Enfim, tive a grata oportunidade de conhecer, enxergar e entender que um hospital produz os mais diversos, complexos e inesperados sentimentos em todos que por ali transitam: profissionais, pacientes, visitantes, técnicos e até palhaços. Que cada ser um tem seu inestimável valor, da função mais simples até a mais estudada. Tive a oportunidade de experimentar a Neurociência na prática, transformando meus antigos medos em alegrias, através da ocitocina (o hormônio do amor) liberada a cada seção voluntária de Humorologia, arte que nos ensina todos os dias que divertido é o contrário de chato e não de sério, que o sorriso é o abraço que se dá de longe e que rir desentope o nariz, por mais vermelho que ele seja…
E mais importante de tudo, descobri que empatia é sobre ouvir e não sobre falar, que a gestão emocional começa pela simples leitura de um olhar e que a tão buscada Felicidade pode ser encontrada a cada instante, em cada conexão, no atendimento e no entendimento, na vitória ou no alívio!
Convido vocês a experimentarem a mesma sensação que eu tenho vivido. Seja um voluntário, onde o seu coração indicar.
Fernando Brancaccio, especialista em Neurociência e Palhaço.